segunda-feira, 28 de novembro de 2016

PAI NATAL E MENINO JESUS: O ENCONTRO (RAP)


eis o tempo a repetir-se
o pai natal pôs-se a mexer
arranjou lauto farnel
deu um beijo à mãe natal
despediu-se dos duendes
agradeceu-lhes o labor
carregou embrulhos mil
todos muito engalanados
era só papel brilhante
e laçarotes de cetim
mandou assobio às renas
segredou-lhes ao ouvido
não se sabe bem o quê
talvez o itinerário
e pôs-se a milhas, por fim

a tarefa era pesada 
mas muito do seu agrado
fazer numa meia noite
o que poucos tinham feito
em certos oitenta dias
(mesmo assim, só em romance!)
ir do norte até ao sul
do leste até ao oeste
sem deixar no esquecimento
sequer uma chaminé
fosse de casa fraquinha
ou do mais belo chalé

aqueceu-se com licor
cantou uma moda alegre
as renas acompanharam
num suave relinchar
(ou relinchar é de cavalos?)

tudo correu à maneira
até uma certa lareira
esqueceram-se dela acesa
ia queimando a traseira
sacudiu as cinzas da roupa
esboçou uma cara feia
depois riu-se divertido e pensou
ora, é natal, não posso levar a mal
por fim, tudo correu bem
empanturrou a barriga
foi leitinho, bolachinhas
e até um potinho de mel 

já ele ia de regresso, destino rovaniemi,
deparou-se-lhe uma estrela
com brilho descomunal
apontando lá para o longe
para um caravançarai

apressou-se na descida
apeou-se do trenó
as renas a resmungarem
cansadas de meter dó
é só mais um bocadinho
segredou-lhes ao ouvido

ouviu uma vaca mugir
e um burrinho zurrar
passou pela multidão
e quem viu ele
quem viu ele?
um menino pequenino
acabado de nascer
mãe dum lado, pai do outro,
três reis cheios de presentes
e muito mais pessoal
todos em adoração

perguntou-se, angustiado
e que faço eu agora
já sem nada para dar?
o menino remexeu-se
virou-se para ele e disse
ora essa, pai natal
não quero qualquer oferta
já te vi, fico feliz
o pai natal,  intrigado
ia mesmo perguntar
mas o menino interrompeu-o
e disse-lhe devagar
quantos meninos no mundo
já viram o pai natal
o verdadiro?
pensa nisto! 
ah! sorriu o pai natal
está bem visto, meu menino...
... Jesus, o meu nome é Jesus
digo-te antes que perguntes
ah! gaguejou o pai natal...
não te assustes, bom velhinho
que não te vou acusar
de concorrência desleal
acho mesmo que nós dois
formamos a equipa ideal
amamos as criancinhas
e mantemos, em conjunto
a magia do natal

despediu-se o pai natal
de coração mais quentinho
montou-se no seu trenó
regressou ao polo norte
esperavam-no, animados
os duendes e a mãe natal
contou-lhes o sucedido
com enorme excitação
abraçaram-se, contentes
beberam uns grogues quentes
e lá foram descansar


(imagem obtida em pesquisa no google)




segunda-feira, 21 de novembro de 2016

BALZAC E A COSTUREIRINHA CHINESA


Balzac e a Costureirinha Chinesa, da autoria de Dai Sijie, é um livro simplesmente delicioso! Conta-nos a história de dois adolescentes oriundos da burguesia intelectual chinesa, que, em plena Revolução Cultural, ao mando do Grande Timoneiro Mao Tsé-Tung, são desterrados para uma aldeia suspensa no tempo e na montanha da Fénix Celestial, junto ao Tibete, a fim de serem reeducados às mãos de camponeses praticamente analfabetos e tacanhamente incultos (à chegada, o chefe da aldeia quase destruiu o violino dum dos rapazes, que confundiu com um simples brinquedo burguês, logo, objecto proibido pelos rigores da revolução...). 

O percurso de (re)aprendizagem passa pelo cumprimento de duras obrigações, incluindo, nomeadamente, o trabalho nos campos e nas minas. Todavia, os talentos narrativos, sobretudo dum dos jovens, acabam por lhes render inesperada vantagem, ao transformá-los em veículos orais dos filmes que passam numa aldeia vizinha, introduzindo na aldeia a única modalidade de cinema aí conhecida, o, por assim dizer, cinema falado...

No percurso, surgem mais dois personagens-chave, uma jovem costureira, a costureirinha, filha do alfaiate da região, e um outro rapaz, também em reeducação. Com aquela surgem os mistérios do amor, com este revela-se um objecto proibido, altamente desejado pelos dois protagonistas, uma mala de livros de autores (ocidentais) clássicos, entre os quais, Balzac (sendo que, em matéria de livros, os comandos revolucionária apenas permitiam o Livro Vermelho...).

São, justamente, estes dois elementos que vêm a estabelecer o fio condutor da acção e a determinar o seu desfecho, pondo, nuclearmente, em evidência a magia e o poder da literatura. Isto, sem deixar de fazer sobressair um conjunto de (outros) valores, como a amizade, a entreajuda, o entusiasmo e o destemor da juventude, o poder de adaptação e de superação (só para mencionar  alguns).

Mas, o que torna este livro verdadeiramente delicioso é, a par da fluidez e limpidez da escrita, a perspectiva adoptada na narrativa, duma pureza da ordem da quase inocência, duma leveza de pássaro distante, que, sem pretender branquear a rudeza da situação de partida -  está lá, em toda a sua nudez -, coloca a tónica nos valores - da ordem dos acima mencionados -, que acabam por sobressair mesmo em situações limite e, logo, em contraponto aos seus opostos. Não esquecendo um fio de humor ou de brincadeira, que perpassa todo o romance.    

Note-se que o Autor, nascido em Chengdu, Sichuan, China, em 1954,  foi, ele próprio, colocado em reeducação entre 1971 e 1974. Mais tarde, veio a estabelecer-se em França, tendo publicado este livro em 2000. Em 2002, adaptou-o e levou-o, sob sua direcção, ao cinema.





    

segunda-feira, 14 de novembro de 2016

MOON, SWEET MOON!







Ainda não vi a prometida grande LUA de hoje, mas ontem, na hora crepuscular, registei-a assim, maravilhosa!














































PEDRO NOITES, A VERDADE!


Eis-me aqui, despido na primeira pessoa, para vos contar o verdadeiramente acontecido neste tempo de menos de um mês, em que vi a minha vida transformada numa espécie de reality show, no qual fui forçado, entre outras coisas, a sobreviver com meia dúzia de dezenas de euros e sem o apoio de ninguém.

Então oiçam:

Naquele dia que vocês já sabem, estava eu muito sossegado da vida, quando, do nada e sem mais nem menos, fui abordado por dois guardas da GNR, embonecados nos seus trajes de ofício e armados das correspondentes armas. Surgiram-me tão ameaçadores e destituídos de motivo alegado que me assustei deveras, tornando-me mais frágil e mais pequeno. Vai daí, em resposta à minha pergunta, - porquê?, expliquem-me porquê, se faz favor!, senti um estrondo deflagrar-me nos tímpanos e um projétil enfiar-se-me nas entranhas. Sem perda de tempo, eu para ali caído, afadigaram-se ambos a encaixar-me na bagageira do veículo de serviço, todo ataviado com a imagem de marca da instituição. Pararam um bocado adiante, no meio do mato, arrancaram-me à bruta daquela sinistra clausura e amarraram-me a uma árvore, como se estivesse capaz de ir a lado algum. Não contentes com isso, dispararam novamente sobre mim e puseram-se a milhas. 

Bem, calculo que se puseram a milhas, porque (felizmente) nunca mais lhes pus a vista em cima e, mal tive acesso a uma TV, vim a saber que tinham abandonado a viatura, substituindo-a por uma outra, que roubaram a um casal, após o terem baleado. Pobrezinhos, quero dizer, o casal, o homem ficou logo ali, esticado que nem um pernil, a mulher ficou ligada a máquinas, em plena suspensão entre os dois lados, o de cá e o de lá. Oxalá recupere, é mais uma valiosa testemunha da minha verdade.

Não sei dizer-vos como sobrevivi, talvez por milagre. O certo é que consegui desenganchar-me da árvore de amarração e fugir a caminho do bosque circundante. Obviamente, era minha intenção alcançar gente, alguém que me levasse ao hospital mais próximo e desse o alerta à minha família e às autoridades, sobretudo à GNR.  

Qual não foi o meu espanto quando, ao tropeçar numa pedra, dei de caras com um ribeiro, onde a minha figura se reflectia intacta, sem marca de beliscadura! Passei as mãos pelo corpo e o sangue tinha desaparecido. Os buracos da entrada dos balázios, idem. Pensei, deve ser do choque ou então foi milagre, assim sossegando o espírito e disposto a reflectir no próximo passo.

Uma apreensão apoderou-se de mim, quem iria acreditar na minha história, se as marcas não estavam lá para a suportar? Pus-me a vaguear pelo mato e, quando pude, puxei a gola do casaco até aos queixos, e entrei subrepticiamente num café de beira de estrada, onde, de cabeça baixa, dei atenção ao que passava na TV, sintonizada no canal do CM.

Ali estava, uma história completamente surrealista, em que o malandro era eu, acusado de ter matado um dos GNR e ferido o outro, deixando-o amarrado a uma árvore, de ter roubado o carro ao casal, matando o homem e deixando a mulher em suspensão entre o cá e o lá, e outras barbaridades mais, que calculo já deveis saber e por isso me dispenso de esmiuçar.

E eu para ali, completamente boquiaberto, vendo a minha fronha espalmada no écran da TV, chamado de fugitivo, ladrão e assassino,  alvo duma monumental caça ao homem. O homem era eu, claro! Registei, tomei consciência.

Saí do café e voltei a embrenhar-me no mato, para obter algum distanciamento que me permitisse pensar no passo seguinte. Duas coisas estavam claras na minha cabeça, primeira, queria ir ter com as autoridades, contar-lhes o sucedido, pedir justiça e protecção, segunda, tinha pavor de que, na tentativa, as autoridades me matassem. Ah! pois, fora isso que ouvira na notícia da CMTV, que as polícias, GNR à cabeça, andavam numa busca desenfreada da minha pessoa, com ordem para abater. Estava enredado num verdadeiro e dramático dilema. Que fazer?

Ainda permanecia na dúvida quando, indisposto, talvez devido ao stress, senti as tripas às voltas. Baixei as calças e acocorei-me atrás duma moita. Foi então que o som dos tiros, acompanhado do ruído das botifarras a esfarrapar o mato,  se aproximou assustadoramente na minha direcção. Apertei-me todo, tal o medo, cheguei a ver balas luminosas roçarem as ervas que me encobriam. Pior, ouvi distintamente uma voz enraivecida, saída dum vulto que pressenti quase sobre mim, proferir, - o sacana não se vai safar, é aparecer e levar um tiro nos cornos! Como fez aos nossos e a mais alguns! Tão certo como eu ser um GNR certificado! 

Tomei uma decisão. Afinal, bem vistas as coisas, não tinha tudo a perder, a minha verdade acabaria por prevalecer, como sempre sucede com a verdade, estava farto de andar a pastar duma moita para a outra e a ouvir desaforos da CMTV e de GNRs desaustinados, e, acima de tudo, precisava duma boa noite de sono. 

Embora não pudesse contactar ninguém e, muito menos, aparecer de visita, tive a sorte de ser resgatado pela Sr.ª D. Coisa, que, em plena actividade de apanha de míscaros, me encontrou descoroçoado, de encontro a uma árvore (já os GNR tinham abandonado a moita). Olhou-me enternecida, fez-me uma festinha na cara e disse, - olha, olha, se não és o Pedrinho, juro que não me chamo D. Coisa! Respondi-lhe que sim, por entre soluços, e ela disse, - nesta vida não há nada que não se resolva, anda até lá a casa, faço-te um chazinho, ok? E eu, que sim, ok, aquilo a calhar que nem ginjas, que os parcos euros estavam a acabar e as noites a ficar frias. Voltei a pensar, só pode ser milagre! Aquilo do chazinho era força de expressão, seguiu-se uma refeição de enfarta brutos, que isto na Província já se sabe.

Passaram os dias, dei comigo a engordar, do descanso e da boa comida da D. Coisa, fiquei um bocado preocupado, com esta cara quem vai acreditar em mim?, contrapus, ora essa, claro que vão acreditar, isto é sinal de consciência tranquila!, e, ainda perdido nestas divagações, aparece-me um par de advogados, oferecendo-se para tratar da minha apresentação a quem de direito, à revelia dos tiros da GNR. Só pude voltar a pensar, milagre! e acrescentei, aleluia!

Daí em diante, foi o que vocês já sabem e, como tal, dispenso-me de relembrar. Afinal o meu objectivo era levar-vos a minha versão dos factos, tal como sucederam. O resto, designadamente aquela espécie de entrevista que não dei à TV do Estado e ao jornalista dum pasquim de Coimbra, não passa de fait-divers, engendrados pelos meus advogados só para contentamento dos telespectadores (já aclimatados ao meu reality show) e cortesia à CMTV.

Para terminar, resta-me confessar o enorme espanto por me encontrar em prisão preventiva!

Enfim, não se dorme nem se come tão bem como em casa da D. Coisa, mas sempre é melhor do que sobreviver entre as moitas a ouvir os tiros e os disparates dos GNRs. Por outro lado, como dizia a minha avó ou a vossa, a esperança é a última a morrer (salvo seja!) e a verdade vem sempre ao de cima.

Vosso,

Pedro Noites





(imagem obtida em pesquisa Google)