domingo, 16 de março de 2014

ESTÁS ASSIM!


Sei que estás assim, de bicho, porque te vi, há dias, não ontem, nem anteontem, nem mesmo antes, lá para antes de quarta-feira, e não eras tu, quer dizer, hoje não és a de quarta-feira, na quinta-feira já não eras a de quarta-feira. Sei, porque vi no espelho, vi fundo no espelho, naquele que se estatela até à raiz mesma do abismo-eu, donde se projectam as sombras mais sombrias que qualquer poço conhece como dedos contados, 1, 2, 3, por aí fora, somas e subtracções. O pior são as subtracções e as suas ameaças. Então é como se um dragão a cuspir monstros, dragões-fogo, queimando almas plácidas, confiantes, titubeantes, desconfiadas, desastradas, de tanto..., enfim, toda a espécie de almas, que almas há de muitas, mas dificilmente resistem, sejam lá como forem, às raivas afiadas de certos dragões. Não falo de dragões de brincadeira, por assim dizer, de Carnaval, dragões de fingir, de alimentar e animar festas chinesas, em Macau. Falo das sombras que viajam das viagens do abismo mais longínquo de que há memória, pior, muito pior, de que não há memória. Hoje, desde quarta-feira, essas sombras tomaram conta de ti, já rondavam, pequeninas, como se pouco sol e menos obstáculos, só inventados, que nem eram, apenas atenuados,  por comparação a posteriori, digo, andavam de mansinho, persistentes, tal qual o princípio de escuridão e electricidade aérea que anuncia forte trovoada. Então, desabou. Assim. E eu grito por que passe, se dissipe rápida, sem estragos, negue os anúncios e os medos e os recados, vá-se embora, como quem reza, Santa Bárbara, São Jerónimo e Santa Bárbara, como me ensinaram quando ainda não tinha idade para ter medo, conhecer sombras ou dragões malditos, a cuspirem sabe-se lá o quê que me deixa assim, com cara de bicho. Sim, sou eu, nem preciso de espelho para me reflectir o abismo-eu, sou mesmo. Por isso, é a mim que me dirijo, quando digo, estás de bicho. Assim me chamei uma vez, auto-reproduzida num pedaço de papel ou numa tela, numa altura em que já tinha travado conhecimento com sombras e dragões malvados. Ainda se as sombras e os dragões fossem ameaça apenas de mim! Quanto eu daria por uma troca de papéis!
 
 
 
 
 

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