segunda-feira, 30 de dezembro de 2013

A NÃO FIGURA DO ANO

 
Já que é tempo de enunciados sucessivos das figuras do ano, porque não destoar um bocadinho e eleger as não-figuras do ano ou as tristes figuras do ano ou qualquer outra coisa que nos passe pela cabeça?
Pela minha parte, fico-me pelas não figuras do ano, aliás, talvez, confundíveis com as tristes figuras do ano, não que muitas das figuras do ano o não sejam, justamente em função de tristes figuras que protagonizaram.
Por outro lado, e para destoar mais um bocadinho, entendo que a categoria não-figura não se esgota nos humanos, embora talvez devesse, pois, reclamando-se de únicos seres pensantes, só a eles deveriam ser assacadas responsabilidades ou méritos. Mas hoje não me apetece ser lógica.
Abreviando:
 
1ª não-figura do ano: TÓ ZÉ SEGURO. Ele existe?
 
2ª não-figura do ano: O CARGO DE PRESIDENTE DA REPÚBLICA. Ele vagou?
 
3ª não-figura do ano: IRREVOGABILIDADE. É preciso perguntar porquê?
 
4ª e última não-figura do ano: EU, ENQUANTO LORPA. Falo por mim, não quero incluir os outros lorpas como eu (existem, sim!). E explico, os lorpas, esta categoria de lorpas, são aqueles que, não sendo lorpas, se comportam como tal, visto serem destituídos de eficácia de intervenção. Sofrem as agruras dos que os tratam como lorpas - bem sabendo que o não são, pois, caso contrário, seriam mesmo uns grandes lorpas, estes, os verdadeiros lorpas -, mas não têm como se defender. Falam, falam, escrevem, escrevem, mas não chegam a lado nenhum. Caso para dizer, quem atinge esta categoria de lorpização, tarde ou nunca passa à categoria de verdadeiro lorpa e vice-versa. Perdoem-me os lorpas que (secretamente) se sentirem identificados, aliás, riam-se de si próprios, que é o que eu faço, ao menos, sendo a primeira a rir de mim, talvez consiga ser a última.
 
Parece-me que este post está um bocado lorpa ... 
 
NOTA: Os elementos aduzidos para definição de lorpa relevam como contributo para cabal esclarecimento do DICIONÁRIO PARA LORPAS, do qual aqui se publicaram os 2 primeiros números (quiçá, únicos) em 8 e 25 de Outubro deste ano. (quiçá é provocação retrógrada)
 
 
 

domingo, 29 de dezembro de 2013

ARE YOU HAPPY NOW?


 
- WHY ARE YOU SO SAD?
- .........................................
 


- TELL ME PLEASE!
- ................................
 
 
 
- OH! PLEASE!
- ....................
 
 
 
- WHY DON´T YOU ANSWER ME?
- .....................................................
 
 
 
- DID I DO SOMETHING WRONG?
- .....................................................
 
 
 
- DID I DO SOMETHING WRONG?
- .................................................
 
 
 
 
- DON´T I DO ANYTHING RIGHT?
- ..................................................
 
 
- ?????????????????????????????????????????????
- OH! GOD! I JUST DON´T LIKE YOUR VOICE! HAPPY NOW?
 
  
 
 

sexta-feira, 27 de dezembro de 2013

DESENHO CRU


Numa segunda-feira de cada mês, um bar do Bairro Alto encerra as portas ao público para as abrir a um grupo de artistas, aspirantes a artistas ou nem isso (categoria esta, em que me incluo). Munidos de cadernos de desenho, lápis, lapiseiras, canetas, aguarelas ou o que mais calhar, não esquecendo as câmaras fotográficas, registamos a acção, a cargo de artistas ou performers que, dando largas à imaginação e criatividade, posam para o grupo. São as noites de Desenho Cru
As imagens que seguem correspondem a registos que fiz no último Desenho Cru, em que as actuações estiveram a cargo do Carlos Vargas e do André de Oliveira .  
 
CENÁRIO
 
 
 
 CARLOS VARGAS
 
  
ANDRÉ DE OLIVEIRA
 

 
 
 
 
 
REGISTOS GRÁFICOS
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 

quarta-feira, 25 de dezembro de 2013

UI, CHOCOLATE!


Adoro chocolate! Se comesse todo o chocolate reclamado pela minha insana gula não sei o que seria de mim, aliás, sei até muito bem e é justamente por isso que não como. Quer dizer, por vezes como, ultimamente até tenho abusado um bocado, coisa que deverá acabar rapidamente.
Isto do chocolate é como muitas outras coisas boas da vida, oferecem-se-nos com todos os brilhos da ousadia e da provocação, mas, vindas como vêm, carregadas de efeitos colaterais, nem sempre se podem acolher nos braços do desejo. Assim recomenda a razão, essa tirana, responsável por surdos  gritos de vontades açaimadas e pela proeminência de frustrações acumuladas. (Ora, se fosse só o chocolate!...)
De há uns anos para cá, tenho reparado que o chocolate vem sendo utilizado para fins diversos do supracitado (dar de comer à gula) e até antes pelo contrário, ou seja, para efeitos supostamente maravilhosos ao serviço da cosmética e terapias conexas. Até já houve uma cabeleireira que me propôs a aplicação dum champô e dum creme amaciador à base de chocolate, proposta que declinei, de imediato, não fosse o cabelo expandir-se, não aprecio cabelos volumosos.
Mas, por vezes, isto da insistência publicitária acaba por produzir os seus efeitos, tipo, água mole em pedra dura... Quer dizer, lá me rendi, comprei um gel dito de chocolaterapia! Bem vistas as coisas, nem foi bem pela magia da publicidade, não por ser pouca, os efeitos anunciados vão do aumento da firmeza de certas zonas estratégicas do corpo à redução da massa gorda doutras, passando pelo milagre anticelulítico e do fortalecimento da musculatura, tudo coisas que qualquer mulher razoavelmente vaidosa (e, ao que consta, cada vez mais homens) não pode dar-se ao luxo de desprezar. Não estou a inventar, todos esses efeitos são convictamente prometidos na embalagem, aliás, para minha grande estranheza, pois não consigo entender como uma coisa que, levada para dentro do corpo, produz celulite, perda de firmeza e, acima de tudo, aumento da massa gorda, pode, uma vez aplicada exteriormente, produzir os efeitos exactamente inversos!  
Perseguida como sou pela maldição do pensamento lógico, não me rendi, pois, aos encantos publicitados. Todavia, dei comigo a acreditar num hipotético efeito semelhante ao induzido pelo fenómeno homeopático, em suma, algo do tipo, aplicação do gel de chocolate gerará a cura da dependência por chocolate, com as adjacentes consequências anticelulíticas, refirmantes e redutoras da massa gorda.
Já comecei a usar, mas ainda não consegui obter a confirmação desta hipótese redentora, apenas posso anunciar que: 1º- o gel deixa um delicado cheiro a chocolate, que, ao menos na 1ª aplicação, me fez recear dar uma dentada num braço; 2º- deixei de usar perfume, por detestar sobreposição de cheiros; 3º- até ver, continuo a reincidir no consumo de chocolates (talvez porque não cheguei a dar a dentada no braço). Se as coisas mudarem (para melhor), não deixarei de partilhar, em benefício de terceiros. Entretanto, não sei que fazer à última caixa de chocolates entrada em casa. Mas não estou a ver como possa ser desprezada.  
 
 
 
 
 
 
 

segunda-feira, 23 de dezembro de 2013

BREVE NOTÍCIA DO "MOLESKINE..."

"Flutuava naquele aconchego morno.
...
...e riram mais alto e já não era só alegria, era mais qualquer coisa, pois ela sentiu uma mínima esfera líquida deslizar pela face dum, e, depois, uma mínima esfera líquida deslizar pela face do outro, mas, como estava entre dois mundos, já não se lembrando muito bem dum e ainda não conhecendo quase nada do outro, não percebeu que esferas eram aquelas, mas entendeu o seu significado, estava tudo bem. Então achou melhor deixar-se ficar naquele macio conforto, visto não ter motivos para voltar para trás, embora pudessem existir, não se lembrava, nem ter motivos para se adiantar, embora pudessem existir, isso ela não sabia, não estando certa de ser por não se lembrar. E, apesar de o seu cérbero talvez ainda não estar completamente regulado, pensou, com acutilante clareza, que, de momento, estar assim era bom, nada para trás, nada para a frente, só o agora e umas festinhas na cabeça, às quais podia responder com uns divertidos pontapés, como quem diz, estou aqui e estou muito bem, o passado já passou e o futuro a Deus pertence. Não percebeu muito bem donde vinha esta frase, a bem dizer, nem a percebeu, a não ser com o coração, que já batia entusiasmado, como só os corações amados. E sentia-se tão bem assim que não acordou. Rita."
Isto é um extracto do "Moleskine de Janete", que comecei a publicar nesta sede há uns meses atrás. Interrompida tal publicação, mas não o projecto, continuei a desenvolver a história, que, entretanto terminei. Presentemente, encontro-me em fase de revisão final e de ilustração.

Pronto, considerem-se informados de que nem todas as interrupções significam desistência e, já agora, de que, no caso, me sinto feliz por ser assim.


  

domingo, 22 de dezembro de 2013

TANTO TEMPO À ESPERA DE NADA


Hei-de  voar um voo magistral
Triunfal
Final
Elevar-me nas alturas do abismo
Suspender-me o tempo do deleite
Deixar-me vogar
Precedendo o simples segundo da inexistência anunciada
Esperada
Anular toda a opacidade da vida
Tanto desperdício!
Caminho doutros caminhos
Ocultos, nenhuns, nada
Apenas um soberbo voo
Magistral
Triunfal
Final
 
 
 
 

TC (TRIBUNAL CARPINTEIRO)


De há uns tempos a esta parte, o Tribunal Constitucional deixou de produzir acórdãos para passar a produzir portas, portas abertas para a criatividade do governo, que, cansado de ter ideias, provoca descaradamente a intervenção daquele, com o mero objectivo de obter ideias novas.
Então, onde o TC fecha uma porta ao governo, logo lhe abre, não uma janela, mas, espanto, uma nova porta, aliás, mais larga.
Com esta harmoniosa carpintaria, sobra, obviamente, uma janela, não para o governo, mas para os reformados. Chama-se janela de ansiedade e consta que dela já se atiraram uns quantos e irão atirar-se muitos mais, em obediência aos desígnios de limpeza da Segurança Social.
 
Em nome da verdade, devo dizer que não li o acórdão, nem, aliás, tenciono ler, pelo que me limito a fazer eco do anúncio público da existência da porta, da autoria do 1º ministro nacional.
 
Já a referência à serventia da janela, trata-se de mero recurso estilístico, talvez dotado dum qualquer poder parabólico ou metafórico, não sei.
 
A ver vamos!
 
 
 
 

OVNI À VISTA!


OU TALVEZ NÃO...





sábado, 21 de dezembro de 2013

PAISAGEM URBANA!


O mais apurado sentido estético erigido em barraca, em pleno apartamento das Avenidas Novas (Lisboa). Mais bonito é impossível!
 
 
 
 
 
 

JET LAG SEM JUSTA CAUSA


Jet-lagged é como me sinto nos dias em que preciso de me levantar cedo e não necessariamente naqueles (pouquíssimos, infelizmente) em que viajo, de avião, através de vários fusos horários, por assim dizer.
Na véspera desses dias tento deitar-me e adormecer mais cedo. Em vão! A luta empreendida nesse sentido não só não resulta como só serve para piorar a qualidade do sono, já de si, habitualmente, péssima, não por qualquer peso de consciência, ao menos que eu saiba, mas, suponho, devido a qualquer enigmática deficiência, quem sabe se oculta inquietação.
Na manhã do DDLC (dia de levantar cedo) fico deveras estranha, assim tipo zombie, para não dizer aparvalhada; lá para a tarde, após dois ou três cafés e bastante ar de rua na cara, começo a atinar, devagarinho; chegada a noite recupero o modo de funcionamento pleno e penso, aliviada, calma, que hoje é uma nova noite!
 
 
 
 

CAOS


A simetria é o impossível da desordem

A desordem é a simetria do acaso

O acaso é o disfarce da coincidência

A coincidência é a organização do caos

O caos é e não é







 
 
 
 
 



sexta-feira, 20 de dezembro de 2013

CARTA AO PAI NATAL



 Caro Pai Natal
 
Esta carta pretende ser muito breve, pois, para além do mais, sei que deve estar super atarefado na ultimação dos preparativos da grande viagem anual, apesar do precioso auxílio dos duendes. Acresce que, como é sabido, em matéria de publicações bloguísticas, a extensão é inimiga da atenção, coisa a que, todavia, não ligo nenhuma, visto não ter leitores (ao menos que deixem rasto e salvas raríssimas excepções e declarados testemunhos verbais).
Não sendo eu uma criança, daí não o tratar por tu, a verdade é que, não obstante as muitas voltas da vida, reside em mim uma persistente criança, que se considera com direito a presentes, se não a toda a hora, ao menos no Natal. Esta a razão da carta, por insuportável insistência da dita e a ver se a consigo calar.
O que ela/nós gostaríamos de lhe pedir não é apenas uma coisa, pois ambas pensamos que, chegado a pedir, mais vale pedir logo tudo, tipo aquela coisa do "perdido por cem perdido por mil", com as devidas (óbvias) adaptações (pedido por cem, pedido por mil).
Passo, então, a elencar os pedidos, sendo a respectiva ordem arbitrária, dado o seu carácter cumulativo:
  • Um lifting
  • Uma viagem à Patagónia, agora para o início de Janeiro
  • Uma viagem ao Japão, em Maio (para visualização de sakura, ou seja, cerejeiras em flor)
  • 3 fins de semana em cidades europeias (Copenhaga, Londres e Amesterdão), em Fevereiro, Março e Abril
  • Estadia de 2 semanas num SPA espectacular, podendo ser na Provença
  • Aumento da velocidade de leitura, de maneira a conseguir ler 1 livro por minuto
  • Continuar a descobrir sítios fantásticos onde escrever, dotados de Internet à borla, para uso nas pausas daquela actividade
...
Oh! não fique com essa cara, Pai Natal, não se vê logo  que estou a brincar? Eu não quero nada disso!
Já aquilo de que lhe falei pessoalmente, isso quero, mas, obviamente, não é para aqui chamado.
Pronto, desejo-lhe bons voos e melhores aterragens.
  
Atentamente,    
A criança de mim
 
P.S. Só para dizer que, ao longo do ano, me portei muito bem, embora deva confessar que não foi por querer, nem tão pouco por crer (que portar-me bem sirva para alguma coisa).
 
2º P.S. Só mais um pedido:
 
 

 
  
 


domingo, 15 de dezembro de 2013

O MENINO, OS DUENDES, O PAI NATAL E ETC. E TAL.


Agora que estamos quase no Natal de 2014, sim, o de 2014, pois o de 2013 está quase a expirar, dou comigo a pensar nisso, no Natal. Nem percebo muito bem porquê, este ano não me tenho sentido nada natalícia, posso até confessar que não fiz presépio nem árvore, nem sequer convoquei os diversos bonecos encantados (com e sem música) que povoam o baú dos Dezembros.  
Vai daí, noite adentro, céu pejado de estrelas rutilantes, passando eu por um caravançarai, ouvi uma vaca mugir e um burro zurrar, o inverso não seria normal, quando, não sem espanto, vi um minúsculo recém-nascido, lourinho e de olhos azuis, agitar-se num pranto desmedido, dominado pelo pânico de ser devorado pelo dito par de animais, ao menos foi o que pensei. 
A mãe estava ao lado, atenta e com olhar doce, nada do que pudesse dizer para o acalmar surtia efeito, mas ela também não disse nada, embasbacada na contemplação do barulhento menino. Do pai, nem falar, fixado, que estava, na espera das visitas, quem sabe se procurando alhear-se dalguma aflitiva incompreensão, talvez fosse isto. 
Juntaram-se umas ovelhas mansas e fofinhas, embrulhadas em algodão em rama, e o menino fixou-as com os pequenos grandes olhos muito abertos, de lágrimas suspensos, os seus mínimos braços pararam de esbracejar, as suas mínimas pernas acomodaram-se no colchão de palha e, não fora um arrepio causado pela gélida noite do deserto, carregada de neve, tudo estaria na perfeição, esquecida a receada fome da vaca e do burro, concentrada a atenção nos prometidos peluches. 
Caso fosse de dia, poderia ver-se a imensidão de areia seca, cor de barro amarelento, cercando o recinto, a rama duma ou outra palmeira adejando na breve aragem morna e um ou outro camelo ondeando, em trânsito. Mas as coisas são como são, era de noite, não vale a pena inventar, a verdade vem sempre ao de cima, diz-se. 
Como era noite estrelada, a magia foi permitida e, então, onde eram pedras nuas deitou-se a corrente  dum rio, que logo se povoou de peixes, onde o tecido se rasgava de secura, irrompeu um acetinado tapete de musgo, daí as ovelhas. O rio e os peixes chamaram dois ou três pescadores e várias lavadeiras, juntou-se-lhes um padeiro, um talhante, uma vendedora de frutas e outra de legumes, o que até se compreende, pois no caravançarai eram servidas refeições. Aliás, foram-se juntando representantes de quase todas as profissões conhecidas, excepto políticos e banqueiros, porque o sítio era demasiado humilde. Ah!, acorreram também muitos animais, para além dos citados, incluindo, galinhas, coelhos, patos e um único peru, mas este viria a arrepender-se amargamente de não ter ficado em casa ou lá onde morava, quer dizer, ter-se-ia arrependido, caso tivesse tido tempo para isso.
Com tamanho ajuntamento de pessoas e animais num remoto local do planeta, habitualmente tão calmo, as estrelas ficaram curiosas, debruçando-se perigosamente do seu majestoso púlpito, tão perigosamente que uma delas, mais afoita ou mais curiosa, se debruçou demasiado e caiu, zzzzzzzzzzzz, aí vou eu, deixando atrás de mim um rasto de brilho.
Três caminhantes do deserto, montados em resignados camelos, vendo a estrela em movimento alucinante, resolveram seguir-lhe o rasto, interessadíssimos em testemunhar o destino da sua audácia. E assim chegaram ao caravançarai, junto ao qual o movimento aumentara substancialmente, agora animado por um grupo de músicos de farda azul e bonés debruados a dourado.
O burburinho era tanto e, sobretudo, tão desacostumado para a região, que os três caminhantes rapidamente se esqueceram da estrela, misturando-se com a multidão - a estrela, satisfeita a curiosidade, tinha conseguido inverter a marcha, retomar altitude a golpe de asa e reinstalar-se no espaço sideral, mas isso eles nunca viriam a saber. Como ostentassem belíssimos e coloridos mantos de seda, bordados a ouro e prata, os outros afastaram-se respeitosa e timoratamente para os deixarem passar, eram outros tempos, pelo que rapidamente estavam frente a frente com o menino lourinho de olhos azuis, sua mãe e seu pai.
O menino, atraído pelo brilho das vestes, distraiu-se das mansas ovelhas e agitou as mãozinhas sapudas na direcção dos três homens, que, não sabendo bem o que haviam de fazer, acharam de bom tom dar os parabéns aos pais. Apresentaram-se, cumprimentaram e partiram um bocado à toa, sem perceberem muito bem o que faziam ali, e à pressa, visto terem desviado significativamente a rota da sua missão. O menino, vendo-os afastar-se, desatou em novo pranto desmedido, não que eles tivessem ouvido, já desapareciam, ao longe, por entre as palmeiras.
Como se do nada, surgiram, então, uns duendes marotos, muito bem vestidos nas suas fardas verdes, rematadas em pontiagudos barretes vermelhos, arrastando atrás de si um magnífico abeto, que, em menos de nada, elevaram diante da criança e decoraram com bolas, sinos, bonecos, caixinhas e muitos outros objectos brilhantes e coloridos. No fim, somaram velas de alto a baixo e acenderam-nas com sopros mágicos, não fossem eles duendes, visto o dono do caravançarai se ter recusado a emprestar-lhes fósforos. Obviamente, o menino ficou encantado com tudo isto, os soluços perderam-se na crescente dilatação dos espaços e as lágrimas transformaram-se em brilhos curiosos. A mãe suspirou, aliviada, e o pai voltou a abstrair-se no longe dos seus pensamentos, sabe-se lá quais.
A vaca e o burro entreolharam-se e, com uma terrível dúvida existencial espelhada na ruminante face, mugiu a vaca, em tom interrogativo, mas, afinal, o que fazemos aqui?, ao que o burro, apanhado de surpresa, se limitou a zurrar, o que é que achas?, assim torneando a sua ignorância e desmentindo a fama que o seu nome impunha. A vaca encolheu os ombros e suspirou para cima do menino, envolvendo-o num bafo quente. Ele estremeceu, assustado, e desatou aos gritos. Desta vez, a mãe procurou confortá-lo com uma chucha, mas, não sendo luxo de que dispusesse, socorreu-se de macia tâmara. Porém, o menino continuava a gritar, não tinha apreciado o sabor do fruto, que rejeitou, exasperado.
Então, impôs-se um alegre ruído de guizos, vindo lá do alto, antecedendo a aparição duns pares de renas, que puxavam uma carroça repleta de embrulhos cintilantes. Rapidamente alcançaram o telhado do caravançarai, onde estacionaram, deixando sair o pai natal, que se apressou a deslizar pela chaminé, apresentando-se, de seguida, junto do menino, empunhando um belo embrulho e sorrindo com bonomia. O menino, deslumbrado, puxou a fita dourada que prendia o papel do embrulho e perguntou ao pai natal, quem és tu e o que é isto? Todos os que ouviram, a começar pelos pais, espantaram-se perante o prodígio do recém-nascido falante. À excepção do pai natal, que, com grande naturalidade, respondeu, sou o pai natal e isto é o teu presente, um iPad. E já se preparava para explicar o que era um iPad e como funcionava, quando o menino, sentando-se muito direito, lho arrancou das mãos, respondendo, eu sei o que isso é e como funciona, lá por ser pequenino não quer dizer que seja info-excluído. Ok, respondeu o pai natal, e afastou-se, tão divertido quanto apressado.
O menino, absorvido no brinquedo novo, aliás, primeiro e único, desatou a consultar vários sites à velocidade da luz, desligou  o iPad e correu atrás do pai natal, espera aí, espera aí!, deixando a assistência, pais incluídos, boquiaberta. O pai natal virou-se, esperou e perguntou:
- O que queres agora, lindo menino?
- Leva-me contigo, por favor.
- Para onde?
- Ora, para a tua terra, a Lapónia.
- Porquê?
- Não te faças de parvo, pai natal, tu sabes, não foi para isso que me deste o iPad?
- Ah!, estou a ver, foste pesquisar em Natal, Presépio...
- Romanos, Pôncio Pilatos, Judas, 1º e 2º milénios e por aí adiante.
- E?
- E, antes que seja tarde, quer dizer, antes que eu complete 33 anos, tira-me daqui, please!
- Agora não posso, estou com pressa, ainda me falta ir visitar um outro menino, que acabou de nascer não longe daqui.
- Ele está à tua espera?
- Não, pode até dizer-se que eu e muitos outros é que estamos à espera dele. Chama-se Jesus, Menino Jesus.
O pai natal já sobrevoava o caravançarai, quando o menino, aliviado, regressou ao berço, enquanto a mãe se dirigia ao pai, desabafando, ai António, este miúdo ainda nos vai dar uma grande trabalheira, ao que ele encolheu os ombros, obcecado que estava sabe-se lá com quê. Como ela o olhasse à espera de resposta, disse, tens razão, Francisca. O menino fingiu que não ouviu, voltou a ligar o iPad e foi explorar os jogos disponíveis.
Não longe dali, os três caminhantes do deserto entregavam os seus maravilhosos presentes ao Menino. 

























 
 
 
 
 
  
 (As fotos são, escusado será dizê-lo, de Natais anteriores.)
 
 
 
 
 

domingo, 8 de dezembro de 2013

MAIS BURRA E UM POUCO FILOSÓFICA!


Dou comigo a sentir-me mais burra. Contudo, ainda consigo atinar com a causa: este ano não viajei e já não vou viajar, contrariamente ao que me tinha prometido. Promessas não cumpridas, carreira política à vista. Isto foi só um aparte. Parvo. (Parvo=óbvio)
 
A ausência de viagens faz-me sentir concêntrica. Para além de burra. Talvez seja a mesma coisa. Concêntrico=burro. Círculo sobre círculo sobre círculo sobre círculo até ao infinito da saturação claustrofóbica. Também entendível como bloqueado, incapaz de sair do sítio.
 
Precisamente o oposto do conceito de em trânsito, que servirá de pano de fundo ao meu livro de viagens, talvez aquele que nunca escreverei, ao menos se continuar neste lastimável estado.
 
Mas posso já adiantar: em trânsito aplica-se a um estado de receptividade divagatória, tipo, vou daqui para ali, mas só me interessa a ideia de trajectória (não confundir com a trajectória), esqueço o aqui, o ali e o quando, declaro-me suspensa do espaço e do tempo ou no espaço e no tempo. Talvez até  me interrompa. Sinto-me receptiva ao que me rodeia porque me transformo no que me rodeia, quer dizer, no espírito da suspensão (interrupção?) escolhida e declarada. Desamarro-me de todos os círculos, bem, de quase todos, sintonizo-me com o que flui dos lugares, das pessoas, sobretudo dos lugares. Sobretudo dos lugares que se confundem com o meu espírito subterrâneo e brumoso. Brumoso está giro, lembrou-me As Brumas de Avalon. Bela narrativa, As Brumas de Avalon! Bruma transparente e luminosa.
 
Contrariamente ao que sucede com quase toda a gente - creio - desfruto com o tempo normal de aeroporto, verdadeira metáfora do conceito de em trânsito. Há tantas histórias suspensas e/ou interrompidas no tempo/espaço duma escala. Não me interessam as histórias, em si, nem sequer me dou ao trabalho de as imaginar, aliás sou despossuída do requerido espírito de observação, mas agrada-me saber que há milhares de histórias ambulantes, passando pela minha, quer dizer, se eu tivesse uma história, que não, não tenho. Apenas uma passagem, nem sempre flutuante.
 
Em trânsito=flutuante.
 
Já me sinto um pouco menos burra, mas preciso desesperadamente de viajar. Não interessa donde nem para onde. Apenas em trânsito.
 
 


quarta-feira, 4 de dezembro de 2013

DOIS LIVROS


Duas sugestões de presentes de Natal ou doutra ocasião qualquer:
  • Para meninas que gostem de escrever, um interessante auxiliar de motivação e aprendizagem da escrita. Só não entendo porque se dirige apenas a raparigas, porquanto, neste domínio, as regras são idênticas para raparigas e rapazes. Uma pena, pois, que a bibliografia e os exemplos apenas contemplem o universo feminino.
 

 
  • Para apreciadores de obras de arte, particularmente, as embaladas em papel de toque acetinado, com aquele cheiro que só os livros conseguem ter. Lindo, o poema, magníficas, as gravuras, delicioso, o papel.     

 
 
O primeiro, vou oferecer; o segundo, ofereci-me, porque eu mereço, como dizem os anúncios da L´Oréal.
 
E não, não é publicidade paga, apenas amor a livros e simpatia por produtos cosméticos.